A Bordo 22/12/2010


Após 36 horas de voo, fui diretamente ao porto de Bluff em Invercargill (extremo Sul da Nova Zelândia) onde embarquei no M/Y Steve Irwin e toda a correria dos últimos dias, os preparativos de última hora, o longo voo acompanhado da incerteza sobre a chegada, o que ainda precisava ser organizado e o que deixou de ser organizado antes de poder desconectar do mundo por algumas semanas, toda a ansiedade relacionada a essas tarefas começa a se desfazer. Partimos rumo à Antártida em apenas duas horas após o meu embarque.

Logo fui notificado sobre a minha a tarefa a bordo, que será relacionada à equipe do deck, mais especificamente um Deckhand, que é o cargo mais baixo que alguém pode ter a bordo (risos), algo comparável a “serviços gerais”. A hierarquia a bordo segue essa estrutura: O Capitão está no topo, seguido pelo Primeiro Oficial e o Engenheiro Chefe. Enquanto o último supervisiona a equipe de engenheiros, o primeiro supervisiona todos os demais setores. São eles: Ponte de Comando (Bridge), Cozinha (Galley), e Deck, cada qual com uma hierarquia específica. Na hierarquia do deck, há o Bosun, os Bosun Mate e os Deckhand (ou seja, lá embaixo na cadeia hierárquica).

Para cada um dos setores há algumas habilidades que são necessárias: navegadores, cozinheiros, engenheiros. Aqueles que não têm uma habilidade que seria útil no navio, esses vão trabalhar no deck. Também é a tripulação do deck que se coloca nas situações de maior risco. Além do risco iminente em estar trabalhando na área aberta de um navio manipulando cordas, graxa, combustível, operando o lançamento e retirada de outros barcos no mar agitado e com o navio em pleno movimento, tudo isso a dez dias de navegação do ponto civilizatório mais próximo, há ainda os riscos específicos das atividades inerentes à campanha em si. É a tripulação do deck que é enviada nas missões de enfrentamento nos barcos pequenos, sofrendo retaliações que vão desde o lançamento de objetos pesados até os poderosos canhões que lançam água salgada em uma temperatura abaixo de zero grau Celsius com uma força incrível capaz de arremessar uma pessoa ao chão. Em resumo, enquanto os tripulantes de outros setores se destacam com alguma habilidade especial, os tripulantes do deck se destacam por não terem a cabeça no lugar.

Ainda estou resistindo em querer entender por que me colocaram na equipe do deck. Se alguém tiver alguma dica, ficarei feliz em lê-la. Ah, e por falar em loucos, a vaga que eu ocupo agora foi aberta (CENSORED) apesar do risco (e do histórico) de acidentes nessa missão. Temos duas pessoas com formação de paramédico (que trabalham no deck com as mãos cheias de graxa). Portanto, não há com o que se preocupar...

Eu já estava familiarizado com o trabalho do deck, pois foi parte do que fiz na experiência que tive a bordo do Steve Irwin em abril desse ano. Como eu não tenho treinamento para trabalhar como oficial na Ponte de Comando, não sou engenheiro e não ousaria fazer com que os 41 tripulantes fossem submetidos a degustar uma refeição preparada por mim, eu não esperava outro posto que não o de Deckhand. Acredito que poderia aprender as tarefas de um cargo baixo na Ponte de Comando (há tarefas como a de fazer vigília durante a noite, tomar notas referentes à rota, operar os equipamentos de comunicação, etc), mas a tripulação já conta com pessoas qualificadas para essas tarefas.

Foto por George Guimarães

As tarefas da tripulação do deck são as tarefas cotidianas do deck, como manutenção das áreas internas e externas do navio (limpeza do deck, dos corredores internos, dos banheiros e de todas as áreas comuns), puxar cordas, enrolar cordas, amarrar cordas, lançar âncora, erguer âncora, carregar, consertar, carpintaria, serralheria, retirada e armazenamento de resíduos, lançamento e pilotagem dos barcos pequenos (que são lançados em momentos específicos da campanha, usados para (CENSORED) contra a frota baleeira e outras intervenções que tencionam sabotar a atividade de caça ou ainda para a transferência de tripulantes entre as embarcações), colocação e retirada das grades que impedem que o navio seja embarcado pela tripulação oponente, supervisão dos tanques de combustível que ficam armazenados ao longo do deck, entre outras tarefas. Tudo isso, vale lembrar, em condições extremas de clima e temperatura, coisa com o que não tenho experiência, mas que não será um impedimento para a realização das tarefas.

Mas a melhor parte do trabalho dos Deckhand é que nós somos a linha de frente no momento do embate com a frota baleeira. Somos nós que operamos o canhão d’água, (CENSORED), que lançamos as cordas para agarrar a hélice das embarcações adversárias, entre outras peças de artilharia usadas na ofensiva. A tripulação do deck tem o trabalho mais duro durante a maior parte do tempo (a manutenção do navio durante a jornada), mas é a tripulação do deck que tem o trabalho mais gratificante, que é o de colocar a frota baleeira para correr ou desabilitá-la por completo para que não possam continuar com a sua atividade assassina.


2 comentários:

  1. Caríssimo George, trabalho duro é com vc mesmo e coragem para enfrentar adversários, nem se fala...
    Amamos vc!

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  2. Vai lá George, do megafone para o canhão de água!!

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